Eu Conheço Alguém Que Morreu de Tanto Amar!

Eu te amo...

Mas, melhor do que eu possa querer amar você, Deus te ama ainda de uma maneira muito melhor do que a minha, pois te ama + do que o amor que eu, pessoalmente possa crer ser o + perfeito!

Ele entregou Seu Filho a ti e a mim por amor, e para isso, se entregou, morrendo por todos os nossos pecados, grandes e pequenos.

Você não precisa de + nenhum acessório para querer a Ele, em sua vida:basta reconhecer que,como todo ser humano,necessita desse amor que Ele lhe ofertou,na cruz.

E, a partir desta simples atitude,você será como eu sou: amada com um amor + do que perfeito!


Um pouquinho de mim para ti...

terça-feira, 13 de abril de 2010


A um senhor

Às vezes o senhor me chamava para seu secretário,e isso me enchia de orgulho. Eu pequeno,o senhor tão grande-maior que um homem comum aos olhos de qualquer menino. Tudo no lugar era pequeno e doméstico,e o senhor,sim,era grande-começa que me acostumei a vê-lo montado,no ritmo do galope ou trote de animais tão de estimação que eram considerados jóias de família,e homem montado,para o menino que mal chegava à crina do cavalo,tinha dimensão de estátua. E por outros motivos: força,trabalho,energia,até coléra,eram tudo grandezas. Então com a pena mallat arranhando o papel,escrevendo a carta que o senhor ditava,ou redigindo-a na trilha das recomendações,eu crescia por dentro,via-me necessário,participante. Mais tarde percebi que o senhor,com suas letras,aprendidas menos numa semana de escola do que na largueza da vida,redigia muito melhor do que eu,apenas queria dar-me o gosto de imaginar que lhe prestava serviço.
Agora,como então,estou escrevendo carta;é para o senhor mesmo,a pedido de ninguém; me pedi. E dá-se isso: passado tanto tempo que não nos vemos,e tendo eu crescido o crescimento natural dos homens,é como se as peripécias desse período não se houvessem desenrolado,e me vejo aquele garoto que o achava maior que os outros homens(não era só pelo vulto alteado na sela,era ainda o tamanho especial da imagem interna). Não cresci,em comparação com o senhor. Tenho a idade que o senhor tinha quando me parecia velho -velho feito de baraúnas e nervos,em todo o caso,velho. E sinto que não alcançarei sua dimensão. Parou o tempo de crescer; muitos outros tempos pararam,nós mesmos estamos parados um diante do outro. Para o resto do mundo,o senhor está longe,inexistente; ninguém mais o lembra,salvo três,quatro pesoas. Mas eu me sento a seu lado e observo,estudo,confiro sua identidade,seu porte; é o senhor mesmo,não mudou nada.
Talvez até se mostre mais completo,como se os traços raspados,a simplificação extrema do semblante revelassem melhor a essência da pessoa,limpando-a do que é mera repetição de outras. Tudo ficou reduzido ao mínimo indestrutível,à relação calada de dois seres,sem interferências de espaço e tempo. O senhor já não está a cavalo,de bota e espora,não tem mais no bolso aquele relógio que marcava a hora de campear. Vejo-o distante de cuidados,de parentes,da lavoura,da tropa,do gado,dos remédios da velhice. Agora o senhor é apenas o senhor mesmo,no que tem de único a criatura no mundo. E lhe escrevo esta carta com escrevia as antigas(era na mesa de jantar,defronte ao pátio ajardinado).
Para lhe agradecer alguma coisa que não foi agradecida na hora,e ficou como presente dado a quem não merecia? É melhor que não se agradeça,evitando diminuir ou pagar o sem-preço. Para me lembrar ao senhor? Para lembrá-lo a mim? Nosso entendimento se tornou tão fácil que dispensa a operação da lembrança. Escrevo-lhe talvez sugestionado porque alguns escolheram um dia para viver mais perto de outros e abraçá-los com ternura diversa? Mas esses abraçam fisicamente alguém em determinada casa,levam presentes,cumprem o ritual,e no nosso caso,isso não é possível.
Não tenho nada de urgente ou especial para lhe contar. Nada a pedir ou a dar,mesmo porque o senhor atingiu a sublime despossuição e desnecessidade de tudo. É que muitas cartas,das mais importantes,se escrevem sem motivo ou interesse imediato,são postas num correio absurdo,que as entrega à sua maneira e assim são respondidas e se estabelece a correspondência infinita. Mas reparo que escrevi demais. O senhor recomendava ao menino: o essencial em duas palavras. Não aprendi a lição. Desculpe,e me deixe pôr a mão em seu ombro,carinhosamente.

(Carlos Drummond de Andrade)

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Espera uma carta

Agora sei porque não vieste,depois de tanto e tanto te esperar. Cheguei a supor que não existisses. Imaginei,às vezes,que foras ter a outra porta,e alguém se beneficiava de ti. Era o equívoco mais consolador,afinal não se perderia a mensagem. Eu indagava os rostos,pesquisava neles a furtiva iluminação,o traço de beatitude,que indicasse conhecimento do teu segredo. Não distinguia bem,as pessoas se afastavam ou escondiam tão finamente tua posse que a dúvida ficava enrodilhada à minha esquerda. O desengano,à direita. E não havia combate entre eles. Coexistiam,mais a cabeçuda esperança.
Todas as manhãs te aguardava. Ao meio-dia já era certo que não vinhas. O resto do dia era neutro. Restava amanhã. E outro amanhã. E depois. Repousava,aos domingos,desta expectação sem limites. Via-te aparecer em sonho,e fechava os olhos como quem soubesse que não te merecia,ou quisesse retardar o instante de comunicação. Esperar era quase receber. Cismava que te recebera havia longos anos,mas era menino e sem condições de avaliar-te,ou vieras em código,e eu,sem possuir a chave,me quedava mirando-te e remirando-te como à estrela intocável.
Muitas vezes recebi durante esse prazo. Não se confundiam contigo. Traziam palavras boas ou más,indiferentes,quaisquer. E o receio de que entre elas rolasses perdida,fosses considerada insignificante? Desprezada,como impresso de propaganda?
As dádivas que devias trazer-me,quais seriam? Nunca imaginei ao certo o que de grande me reservavas. Quem sabe se a riqueza,de que eu tinha medo,mas revestida de doçura e imaginação,a resumir os prazeres do despojamento? Ou a glória espiritual,sem seus gêmeos,a jactância e o orgulho? Ou o amor-e esta só palavra me fazia curvar a cabeça,ao peso de sua magnificência. Eu não escolhia nem hesitava. O dom seria perfeito,sem proporção com o ente gratificado. E infinito,a envolver minha finitude.
Mas agora sei porque não vieste nem virás. Estavas entre inúmeras companheiras,jogadas em sacos espessos,por sua vez afundados num subterrâneo. E dizer que todos os dias passei por tuas proximidades,até mesmo em cima de ti,sem discernir tua pulsação. Servidores infiéis ou cansados foram acumulando debaixo do chão o monte de notícias,lamentos,beijos,ameaças,faturas,ordens,saudades,sobre o qual os caminhões passavam,passavam os governos e suas reformas. Escondida,esmagada no monte,sem sombra de movimento,lá te deixaste jazer,enquanto que eu conjecturava mil formas de extravio e omissão. Cheguei a desconfiar de ti,a crer que zombavas de minha urgência,distraindo-te por itinerários loucos. Suspeitei que te recusavas,quase desejei que fogo ou água te liquidassem,já que te esquivavas à tua missão.
E foi o que aconteceu,sem dúvida. A umidade e os ratos de esgoto te consumiram. Restam -se restarem-fragmentos que nada contam ou explicam,senão que uma carta maravilhosa,esperada desde a eternidade,por mim ou por outro qualquer homem igual a mim, foi escrita em alguma parte do mundo e não chegou a destino,porque o Correio a jogou fora,entre trezentas mil ou trezentos milhões de cartas.

(Carlos Drummond de Andrade)

domingo, 11 de abril de 2010

Amar

Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer, amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?
Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?
Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho,
e uma ave de rapina.
Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor à procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.
Amar a nossa falta mesma de amor,
e na secura nossa, amar a água implícita,
e o beijo tácito, e a sede infinita.


(Carlos Drummond de Andrade)